Antes de adentrarmos no tema propriamente dito, é necessário sabermos o significado da palavra “dízimo” que por assim dizer, significa: décima parte. Presente em outras tradições e culturas chegou-nos através de inúmeras citações do Antigo Testamento, que atestam sua prática entre os israelitas. Recordemo-nos que no tempo das doze tribos de Israel, a tribo de Levi servia ao altar e era pobre, desprovida de rebanhos e campos para cultivar. Deviam ser sustentada pelas outras onze tribos que separavam uma parte de suas colheitas e de seu rebanho e entregavam aos levitas, bem como aos estrangeiros, aos órfãos e às viúvas.
O livro do Deuteronômio refere-se a dois tipos de dízimo (Cf. Dt 14,22-28): um anual e outro trienal. Ano a ano, a décima parte devia ser tomada dos produtos agrícolas e trazida ao Templo para o banquete sagrado. A cada três anos era deixada nas portas para alimentar os pobres.
“Devolver ou não” o dízimo é questão que aflige a uma parcela considerável de católicos. Alguns resistem em participar da pastoral do dízimo em suas comunidades alegando, entre outras coisas, a legendária “riqueza” da Igreja. Estes, são católicos até participantes, mas que ainda na sua consciência existem resquícios de uma ideia antiga de Igreja, a considerando mera provedora de bens espirituais, não precisando, portanto, de recursos para se manter. Não nos esqueçamos que o dízimo perdeu a sua força na Igreja católica aqui no Brasil, porque até a Proclamação da República, os dízimos eram cobrados pelo estado e este os repassava à Igreja. Como era um imposto e tinha uma administração falha, perdeu a sua credibilidade e gerou certo preconceito no meio católico, que perdura até os dias atuais.
A entrega do dízimo não é pagamento! Nenhum cristão “deve” dízimo à Igreja. Ao trazer mensalmente seu dízimo, o fiel não está pagando pelo serviço religioso do qual usufrui. Nem o faz com interesses pessoais, para ganhar bênçãos e assim multiplicar sua renda ou reservar para si um lugar no céu. A ideia de que Deus recompensa nosso dízimo com riquezas é uma afronta à palavra divina. Quem dá esmolas para ficar rico, não dá nada! Está fazendo comércio! Quem doa, não espera nada em troca. Há uma mística a se resgatar no gesto da entrega do dízimo, a saber: Deus é generoso e clemente. Tudo lhe pertence. Em sua misericórdia criou o mundo e tudo que existe para o bem do ser humano. Ele concede dons, talentos, inspiração, capacidade de criar e trabalhar a todos os viventes. Quem produz algo, o faz porque o Senhor o permite. Revela-se assim o dízimo como um gesto de gratidão para com Aquele a quem tudo devemos.
O dinheiro oferecido de acordo com as posses e consciência de cada um é humilde reconhecimento de que sem Deus nada se é, nada se tem. Mas Deus não precisa de dinheiro, poder-se-ia contra-argumentar. Mas os pobres, seus ministros e a comunidade necessitam se manter. Vê-se aí o dízimo numa dimensão de partilha e solidariedade. Deus se identifica com as necessidades dos pobres e da comunidade. A subsistência da Igreja sempre dependeu da colaboração dos fiéis.
A Igreja Católica não obriga seus fiéis a contribuir com o dízimo. Também não os obriga a doar o valor que corresponde ao sentido da própria palavra: décima parte. São Paulo esclarece em sua segunda carta aos cristãos de Corinto: “Que cada um dê conforme tiver decidido em seu coração, sem pesar nem constrangimento, pois “Deus ama quem dá com alegria” (II Cor 9,7). Há os que doam mais que a décima parte e os que doam bem menos. A quantia em si mesma não importa. Entregar o dízimo não é garantia de salvação. Quem entrega o dízimo não pode se considerar melhor cristão. Por outro lado, embora a palavra dízimo tenha o significado de dez por cento, décima parte, São Paulo nos ensina que a nossa contribuição não necessita se basear num percentual rígido, o critério para definir o valor do dízimo é o impulso do nosso coração.
Devemos contribuir com o máximo que o nosso orçamento possa suportar. Assim, quem pode dar 10% não contribua com menos. Quem puder dar 5% não dê 4, quem puder dar 3% não dê 2. Dê cada um conforme o impulso de seu coração sem tristeza nem constrangimento, pois Deus ama a quem dá com alegria! Proliferam atualmente seitas cujo único objetivo parece ser explorar a boa-fé de pessoas carentes e desesperadas. Com promessas de curas e de progresso material realizam campanhas alardeando libertação para todos os tipos de males. Usam o nome de Deus em vão a todo o momento. “Em nome do Senhor Jesus” é a senha pela qual encantam os que buscam soluções imediatas para seus problemas. Os métodos usados nestes empreendimentos religiosos são refinados e bem articulados. Não atacam diretamente as contas bancárias dos fiéis, mas cuidam de seduzi-los aos poucos. As pessoas se entusiasmam com o horizonte de prosperidade que lhes é anunciado. Muitas vezes se privam do essencial para não deixar de contribuir com o funcionamento destas novas seitas. Esta constatação não macula o sentido e a importância do dízimo em suas raízes bíblicas, teológicas e eclesiais. Não podemos confundir, contanto, a oferta espontânea do dízimo com exploração financeira.
O QUE É DÍZIMO?
O dízimo é uma contribuição voluntária, regular, periódica e proporcional aos rendimentos recebidos, que todo batizado deve assumir como obrigação pessoal – mas também como direito – em relação à manutenção da vida da Igreja local onde vive sua fé. O dízimo é uma forma concreta de manifestar a fé em Deus providente, um modo de viver a esperança em seu Reino de vida e justiça, um jeito de praticar a caridade na vida em comunidade. É ato de fé, de esperança e de caridade. Pelo dízimo, podemos viver essas três importantes virtudes cristãs, chamadas de virtudes teologais, porque nos aproximam diretamente de Deus. O dízimo é compromisso de cada cristão. É uma forma de devolver a Deus, num ato de agradecimento, uma parte daquilo que se recebe. Representa a aceitação consciente do dom de Deus e a disposição fiel de colaborar com seu projeto de felicidade para todos. Dízimo é agradecimento e partilha, já que tudo o que temos e recebemos vem de Deus e pertence a Deus.
QUE PASSAGENS DA BÍBLIA NOS FALAM DO DÍZIMO?
São muitíssimas. Por sua Palavra, Deus nos convida: a confiar nele, que é o único Senhor de tudo; a ser-lhe agradecidos, porque ele é a fonte de todo bem; a colaborar com ele na instauração de uma nova sociedade, em que haja partilha e comunhão de bens, e em que não haja necessitados. Nos textos que seguem, podemos conferir essa divina proposta. A título de exemplo, citamos apenas algumas passagens bíblicas. Veremos primeiro, que os patriarcas de Israel sabiam reconhecer os dons de Deus e lhe eram agradecidos, oferecendo-lhe a décima parte de tudo o que possuíam: “Abraão deu ao Senhor a décima parte de tudo” (Gn 14,20). Jacó disse: “Eu te darei a décima parte de tudo o que me deres” (Gn 28,22). Através do profeta Malaquias, Javé reclama do povo a oferta do dízimo, e lhe faz a ousada proposta de fazer a experiência do dízimo, como sinal de confiança nas graças que somente ele, Javé, pode dar. Diz Javé: “Vocês perguntam: Em que te enganamos?¹ No dízimo e na contribuição. Vocês estão ameaçados de maldição, e mesmo assim estão me enganando, vocês e a nação inteira! Tragam o dízimo completo para o cofre do Templo, para que haja alimento em meu Templo. Façam essa experiência comigo. Vocês hão de ver, então, que abrirei as comportas do céu, e derramarei sobre vocês as minhas bênçãos de fartura” (MI 3,8-10).
QUANTO SE DEVE OFERECER DE DÍZIMO?
Deve-se ofertar a Deus o que mandar o nosso coração e o que a nossa consciência falar. Os israelitas davam dez por cento do que colhiam da terra e do trabalho. Daí vem a palavra dízimo (como já mencionado), dez por cento daquilo que se ganha. Veja como Deus é bom. Ele lhe dá tudo. Deixa nove partes para você fazer o que precisar e quiser, e pede retorno de somente uma parte. Assim, todos somos convidados a ofertar de fato a décima parte. Mas é importante perceber o seguinte: dízimo não é esmola, nem sobra, nem migalha, pois Deus de nada precisa. Ele quer nossa gratidão. Deus quer que ofertemos o dízimo com alegria e liberdade. Embora a palavra dízimo tenha o significado de décima parte, ou dez por cento, cada pessoa deve livremente definir, segundo os impulsos de seu coração, sem tristeza e nem constrangimento, qual seja o percentual de seus ganhos que deve destinar ao dízimo a ser entregue para a sua comunidade.
No entanto, a experiência tem comprovado que aqueles que, num passo de confiança nas promessas divinas, optaram pelo dízimo integral, isto é, pela oferta de 10% de tudo que ganham não se arrependeram de tê-lo feito e nem sentiram falta em seus orçamentos. Ao contrário, sentem-se mais abençoados que antes, quando suas contribuições eram proporcionalmente menores. Há muitos dizimistas que dão este testemunho: quanto mais se oferece de dízimo, mais se ganha. Pois, o dízimo é um ato de fé em Deus, que não deixa na mão os que nele confiam. De qualquer modo, cada dizimista deve sentir-se livre diante de Deus para fixar o percentual de sua contribuição. O dizimista não deve preocupar-se com o que sai de seu bolso (se muito ou pouco dinheiro), mas o que sai de seu coração (se pouco ou muito amor a Deus e à comunidade).
O DÍZIMO DEVE SER MENSAL, BIMESTRAL OU ANUAL?
Em princípio, o dízimo deve ser oferecido cada vez que se recebe algo: o salário, uma doação ou o resultado de uma venda importante. De modo geral e prático, podemos dizer que a oferta do dízimo deve ser mensal. Assim como você recebe seu salário todo mês, assim também mensalmente deveria fazer sua oferta do dízimo. Por isso, é necessário educar-se para fazer mensalmente a oferta do dízimo. Se o católico, que recebe mensalmente o seu salário, não se educar para o dízimo mensal, ele irá dar, uma ou outra vez, aquilo que sobrar. E isso não é dízimo, mesmo que seja uma grande quantia! Se desse mensalmente apenas 1%, mas com alegria e consciência, seria melhor. Sendo uma contribuição regular e periódica, e proporcional ao ganho de cada dizimista, o dízimo deve ser entregue na comunidade com a mesma regularidade com que acontece o recebimento de seus ganhos. A contribuição mensal de cada dizimista favorece também a organização da Pastoral do Dízimo, na comunidade, na paróquia e na diocese. Sabendo quanto recebe mensalmente de dízimo, a Igreja pode fazer seus orçamentos e previsões, bem como pode prestar contas regulares ao povo.
POR QUE, PARA ALGUMAS PESSOAS, É TÃO DIFÍCIL OFERECER O DÍZIMO?
Vivemos numa sociedade em que o dinheiro e o lucro ocupam o lugar de Deus e das pessoas. Jesus Cristo nos adverte que é impossível servir a dois senhores, adorando ao mesmo tempo a Deus e ao Dinheiro (Lc 16,13). Mesmo assim, há cristãos que seguem a proposta do mundo. A sociedade materialista e consumista em que vivemos nos ensina a reter, concentrar, possuir, ter, ganhar, consumir, acumular. Somos incentivados a ter corações egoístas e fechados. O Evangelho, ao contrário, nos ensina que só quem é generoso e não tem medo de repartir o que possui está, de fato, aberto para acolher os benefícios de Deus. São dois projetos bem diferentes: a sociedade consumista e egoísta ou o Reino da partilha e da justiça. É preciso fazer uma escolha entre o Reino de Deus e o reino do dinheiro.
O QUE O DÍZIMO TEM A VER COM DEUS?
O povo de Israel foi o primeiro povo da história humana a acreditar em um só Deus, que governa todo o Universo. Foi também, o primeiro povo a acreditar que, se o homem vive, é por vontade e querer desse Deus, que criou o ser humano “à sua imagem e semelhança”. Por esse motivo passou a fazer parte da vida desse povo à retribuição, o agradecimento. Todo judeu oferecia a décima parte de seus bens, como retribuição dos bens recebidos de Deus. Como nós, cristãos, temos nossas raízes destes, herdamos certas formas de homenagear o nosso Deus, e, portanto, o dízimo é uma das mais antigas formas de agradecimento do ser humano a Deus.
O DÍZIMO EM NOSSA VIDA
Devemos participar do dízimo na consciência da comunhão com Deus, da participação de seu plano de salvação e do estar em comum união com a comunidade. Com esta viva consciência, não estamos apenas contribuindo para a edificação do Reino de Deus, senão que, também testemunhando os valores cristãos. O dízimo é pessoal! Ao devolvermos a Deus o que lhe pertence, fazemos nossa parte, e ajudamos nas três importantes dimensões presentes na Igreja, a saber: dimensão religiosa que tem como finalidade manter todos os gastos da Igreja; reformas, construções, pinturas, salários, materiais litúrgicos, água, luz, telefone, materiais de limpeza, etc. Dimensão missionária: investir nos diversos grupos (pastorais) da Igreja quer seja dos jovens, adultos, crianças ou idosos para um crescimento espiritual e a dimensão social: que tem por finalidade, investir em obras de caridade e ajudar aos mais necessitados.
Quando permitimos sermos conduzidos por Deus, entendemos e compreendemos com o coração e com a alma, os desígnios e os planos de Deus em nossa vida, e passamos olhar as realidades com o olhar sobrenatural, ou seja, olhar de Deus. Que possamos, ao refletir este texto, ter o olhar de Deus e assim nos conscientizarmos que nós precisamos mais de Deus do que Deus de nós.
Por Seminarista José Raimundo Almeida